Estávamos a espera de receber uma encomenda do Brasil! A mãe da Thá, através dos Correios, enviou um pacote para o nosso endereço em Moçambique. O valor pago no Brasil foi alto, pois os correios cobram por quilo, isto é, 100 gramas ou um quilo equivalem a mesma taxa!
Mas para quem acha que iríamos receber o pacote em casa, aí vai a surpresa.... Moçambique não tem uma estrutura de correios feito no Brasil, ou qualquer outro lugar do mundo.
O que aconteceu? Recebemos em nossa casa, no dia 27 de Novembro, uma carta com um aviso de que havia chegado uma correspondência do Brasil para a Thaís Chystina. E aí veio a dúvida.
Onde retirar?
Onde pedir informações? Onde está a encomenda? Nenhuma dessas respostas vieram no "bendito" papelzinho, que foi deixado com a "mama", uma senhora muito gorda, que trabalha como porteira do nosso prédio.
Vale salientar como foi a entrega do aviso de recebimento por parte da "mama". Ela ficou cerca de meia hora brincando com a Thaís antes de lhe entregar o papel, fazendo suspense, isso porque receber uma notícia de encomenda do Brasil, na visão dos Moçambicanos é ganhar um mega presente. Mas convenhamos; as 8 da manhã, você atrasado para o trabalho e a Mama enrolando para dar o papel...
O sangue paulista da Thaís já começou a ferver! Sempre sorrindo, a Thaís disse inúmeras vezes:
-Vamos Mama, qual é o presente? Por favor, me dá o presente.
Depois de conversarmos com amigos brasileiros fomos direto para a agência do correio na baixa (baixa da cidade, pois Maputo tem a Alta e a Baixa, como Salvador). Descobrimos pelos nossos amigos, que é lá que chegam as correspondências internacionais. Fomos por volta das 14 horas, a temperatura era em torno de 40º graus e quem nos levou foi o Costa, taxista amigo, que nas horas vagas conserta nossa geladeira e compra gás!
O prédio do correio lembra filmes dos anos 30 no Brasil, fica na parte térrea de um prédio, sem paredes, uma área livre com um grande balcão baixo, na altura do joelho e sem ninguém para nos receber. Depois de chamarmos, uns Moçambicanos vieram ter conosco, pediram o papel e sumiram dentro de uma porta, ao fundo da sala. Pela fresta era possível ver pilhas e pilhas de pacotes! Deveríamos ter pedido para que pintassem o embrulho de vermelho no Brasil, assim seria mais fácil de encontrá-lo! Sorte! o gajo apareceu com o pacote e em seguida nos levou a uma sala lateral.
A sala funciona como uma alfânddega, todos os embrulhos tem que ser checados, isto é abertos com uma faca, daquelas de filmes de terror! Dentro da sala estavamos nós, um outro brasileiro, que pelas roupas era de alguma igreja evangélica e uma senhora de bengala.
O brasileiro da igreja estava a brigar pois não queria pagar as taxas do correio, alegava que sempre que ia retirar os pacotes tinha que pagar mais - sim aqui se paga para retirar o pacote - Como somos educados fizemos um gesto para a senhora passar na nossa frente, ela tinha um embrulho do tamanho de uma almofada, parecia leve e rápido. O funcionário pegou a "guinzo 2000 moçambicana", abriu o pacote e para a nossa surpresa voaram milhares de comprimidos na mesa inteira!
A senhora lentamente explicou que era médica que os remédios eram para ela e o funcionário mais lento ainda falava que aquilo poderiam ser drogas. Iniciou-se uma discussão de "lesmas"! Ele não tinha como checar o que eram aqueles remédios, ela era maluca ou se aproveitava da falta de estrutura e pediu tantos remédios! Nossa sorte foi que num lapso de agilidade, o funcionário pegou nosso pacote, e passou à frente. Isto é, ele parou de atender a velhinha com seus milhares de comprimidos - no minimo uns 500 - e abriu com a faca em nossa frente; o pacote que a mãe da Thá havia nos enviado. Nesse momento os olhos da Thá se encheram de lágrimas, ela ficou um tanto constrangida, pois não esperava por aquele ato. O gajo da alfândega, deu uma olhada rápida e verificou que havia apenas objetos sem muito valor: fotos, roupas, doces, dois cds, nada de drogas nem remédios! Em seguida, ele carimbou nosso papelzinho e nos encaminhou com o embrulho todo rasgado para um terceiro guichê.
No terceiro guichê; mais uma amostra da velocidade moçambicana: uma senhora estava a dormir no balcão. O guichê tinha uma placa: CAIXA. Nós a acordamos (sempre sorrindo, pois se perdermos a paciência, o negõcio se torna 10x mais lento) e mostramos o papel, agora com os 2 carimbos. Ela, a passos de tartaruga, pegou o papel, arrastou a máquina de calcular e começou uma conta que dever ser muito complexa, pois demorou uns 10 minutos! No final nos disse que tínhamos que pagar 34 meticais, equivalente a 3 reais. A Thá perguntou estarrecida, o motivo pelo qual deveria pagar, pois a mãe dela já havia pago a encomenda no Brasil. A senhorinha explicou que o valor era referente ao papel de aviso e aos dois dias de "aluguel" do espaço do correio. Isso significa que quanto mais tempo demorarmos para retirar a correspondência mais temos que pagar.
Empresas como as de telefonia, água, luz e internet tem alguma estrutura na entrega de cartas, faturas e contas. Já o correio é extremamente falho, não existe CEP, apenas nomes de ruas. Em regiões mais afastadas principalmente nas províncias ao Norte de Moçambique, as ruas não têm nem nome.
Na última sexta-feira, após quase 1 hora de espera, em um calor de 40º graus, recebemos finalmente nosso embrulho. Cores e sabores diretamente de casa.
ps. O taxista Costa nos levou e comentou que o atendimento foi bom, "aqui de vez em quando é uma bagunça, todo mundo fica a procurar suas coisas jogadas pelo chão!"