sexta-feira, dezembro 12, 2008

Cólera no coração da África Austral

Zimbábue a "Casa de Pedras" ao centro da África Austral, o país mais rico da África, independente desde 1980 é agora um cenário de "RESIDENT EVIL" com zumbis "coléricos".

Como não sou jornalista é claro que demorei muito mais do que esperava para conseguir escrever este texto, comecei a escrever no dia 8, feriado Muçulmano (Eid ul Adha - comemoração do final a peregrinação a meca) pouco visto no Brasil, mas que agora sei é tão grande quanto o Natal, e só terminei agora!

Infelizmente estou acompanhando as últimas notícias a respeito da cólera pelo mundo e vejo que muitas informações não estão sendo levadas em consideração: a crise política no Zimbábue de Robert Mugabe, a história política dos países fronteiriços e a atual estrutura de saúde em boa parte dos países da África Austral são fatores que indicavam a crise atual.

Assim como no Brasil, a cólera é uma doença presente, que tem que ser combatida sistematicamene, está em quase todos os países da África Austral exceto Angola e Namíbia.

(foto da fronteira em um dia comum, comércio de alimentos e "chapas" ao fundo, que negociam a viagem até a cidade mais próxima)

Zimbábue está a mais de uma década em crise e Mugabe está no poder desde 1980, seu povo esta fugindo da fome, miséria e total falta de estrutura social e governameental. Faz anos que governos de outros países assistem a esta situação e apenas foram noticiadas, em forma de ironia, notas sobre os 100.000.000 (cem milhões de dolares Zimbabueanos). E o que foi feito pela comunidade Internacional; União Européia, SADC (Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral) ou UA (União Africana)? Após as eleições de 2008, houve por parte dos EUA um embargo economico, e por parte das ONGs um trabalho constante de remediar o desastre para onde se seguia o país.

Somente agora, nos últimos dias, é que estas questões estão sendo levadas ao Conselho de Segurança da ONU, principalmente pela possibilidade de uma intabilidade generalizada por toda a África Austral.

" A União Africana, que tem 53 membros, disse que a única solução para a crise política e econômica no Zimbábue são as negociações entre os rivais políticos"


Ao redor do Zimbábue, países como Moçambique, Zâmbia, Botswana vivem uma estabilidade extremamente frágil e recente, mesmo a froteira com a África do Sul, próxima sede da copa do mundo de 2010 não é preparada para qualquer situação diferente da habitual.

A economia de boa parte destes países é baseada em investimentos internacionais (doações), cerca de 60% do Pib destes países são de dinheiro internacional (em Moçambique chega a 80%), com exceção a África do Sul e Angola, não há indústrias, mercado consumidor, a maioria da população vive das machambas (agricultura de subsistência) sendo as poucas indústrias existentes nestes países extremamente frágil e incapaz de absorver tal crise.

No caso do Zimbábue praticamente toda a economia acabou, inflação de 231.000.000% não há alimentos, tudo que é produzido no Zimbábue, que já é pouco, é comprado e enviado par o estrangeiro, boa parte do que se consome de frutas e legumes em Moçambique e África do Sul é do Zimbábue, os salários, pagos em moeda Zimbabueana não tem mais valor, pois a própria moeda do País não é mais aceita em boa parte do mercado, e assim como Dillan, meu professo Zimbabuano, a tempos que os Zimbabueanos estão deixando seu País.

(foto: lado moçambicano da fronteira, uma pequena cidade sem rede de água e esgoto)



Atual situação da Cólera (estes dados mudam dia a dia)

Zimbábue:
Casos de cólera em todas as 10 províncias do País, vale a pena observar que os dados oferecidos não são mais do governo, e sim da ONU, que estima em 15.219, podendo chegar a 16.000 pessoas infectadas, e 774 casos de óbito, podendo chegar a 800, estes dados são de pessoas presentes nos centros da ONU. Com certeza os números são maiores, devido a pessoas que não procuram os centros médicos e a incapacidade da ONU de cobrir toda a extensão do país.

Estas pessoas infectadas não estão mais recebem atendimento adequado, não há mais leitos, remédios, comida e nem água potável, estão fugindo, andando dias a pé ou de boléia (de carona) para os países vizinhos, vem sem documentos, sem passaportes (quem sabe como é o passaporte do Zimbábue?), desnutridos e, sem estrutura, contaminando novas pessoas pelo caminho.

Já há relatos de cólera em Botwana e Zâmbia, países que tinha a cólera sobre controle.

Mesmo no Congo, que não faz fronteira com o Zimbábue e que passa por uma situação de guerra civil, há relatos da única organização ainda no território, os Médicos sem Fronteiras, relataram 45 casos de cólera próximos ao distrito de Goma, ao sul do país.

Mas é na África do Sul e em Moçambique, países que tiveram um surto de cólera em 2004, que se encontra um fuxo maior de pessoas em fuga e novos casos de cólera.

Na África do Sul
A fronteira terrestre de Beit Bridge, sobre o rio Lipompo, nome da Província ao norte do país, é o ponto de maior tensão, muitos Zimbabuanos estão se deslocando para lá, devido a proximidade com a capital do Zimbábue, e em busca de material de primeira necessidade: alimentos, remédios e água potável e mesmo para atravessarem a fronteira para a África do Sul em busca de tratamento, a vila de Musina, 12k de lá já relata oficialmente cerca de 619 zimbabuanos contaminados destes 66 internados e 8 casos de óbitos (isto a 3 dias atrás). Há relatos de filas de mais de 7 horas na fronteira, de pessoas sem documentos e sem condições de atravessar, estão sem rumo e sem caminho a seguir.

Não vamos esquecer que a 3 meses atrás na África do Sul houve um surto de xenofobia contra os zimbabuanos, Moçambicanos e outros povos devido a falta de trabalho no país, que teve um saldo de 6 mortes e várias casas pilhadas, além de espancamentos e roubos.

Em Moçambique a situação não está melhor, 4 dos 10 distritos fazem fronteira com Zimbábue:

(foto: Policiais da fronteira organizando a "bixa" de carros e cobrado "refresco" aos apressados)

Com fronteira terrestre com Zimbábue.

Tete:
onde a vale do Rio Doce, está trazedo 2.000 brasileiro e contruindo uma de suas unidades já relata 83 casos da doença
Manica:
relatam 116 contaminados e 48 a 51 óbitos por cólera (não confirmados).
Maputo:
um óbito, sem dados de contaminados

Sem fronteira terrestre com o Zimbábue

Zambézia:
59 casos de cólera, 2 óbitos confirmados
Cabo Delgado:
1 óbito confirmado

(fontes: números fornecidos por Jornais Moçambicanos)


O sistema de Saúde em Moçambique é extremamente falho, mas segundo as autoridades, esta sendo "preparado" para atender a população.

Atualmente um caso de cólera atendido em qualquer localidade do país vira uma ficha preenchida a mão pelo médico da localidade, estas fichas são arquivadas e enviadas mensalmente para o Ministério da Saúde por CORREIO, chega e leva em torno de um mês para ser lida e analisada, portanto o tempo de resposta do ministério da Saúde a uma Epidemia tem um atraso em média de 2 meses, isso se o correio funcionar.

Há ainda relatos como o da igreja Johan Marangue, em Manica, que se recusaram aos tratamentos e medicamentos, levando a morte de vários de seus seguidores.

Próxima postagem: A viagem daqueles que fogem do Zimbábue.

Notas:

A cólera (ou cólera asiática) é uma doença causada pelo vibrião colérico (Vibrio cholerae), uma bactéria em forma de vírgula ou bastonete que se multiplica rapidamente no intestino humano produzindo uma potente toxina que provoca diarréia intensa. Ela afeta apenas os seres humanos e a sua transmissão é diretamente dos dejetos fecais de doentes por ingestão oral, principalmente em água contaminada.

África Austral:
África do Sul
Angola
Botsuana
Lesoto
Madagáscar
Malaui
Maurícia
Moçambique
Namíbia
Suazilândia
Zâmbia
Zimbabue

Mapa do Zimbábue e fronteiras




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